Quando se fala nos regimes de treinos no futebol, em especial no futebol
feminino, é muito comum esquecermo-nos de alguns pormenores que podem fazer
toda a diferença. Muito se tem falado do profissionalismo com que algumas
equipas (femininas) em Portugal já trabalham, mas continuam a escapar-nos
aspetos essenciais que visam a melhoria da performance da jogadora.
Várias foram as notícias e os estudos que saíram nos últimos tempos
acerca deste assunto, mas ainda há um longo caminho a percorrer neste tema. É
um erro desvalorizar ou subestimar os efeitos do ciclo menstrual na performance
da jogadora, isto porque a variação hormonal que acontece durante o ciclo
menstrual despoleta alguns fatores que são decisivos para um bom desempenho
desportivo.
A fadiga é um dos aspetos que interfere na performance da atleta, sendo
que é comum no período pré-menstrual a atleta sentir mais fadiga. A verdade é
que este é um tema que continua a ser atirado para segundo plano muito por
culpa do amadorismo que ainda comanda o futebol feminino em Portugal.
Ainda assim, o amadorismo não pode nem deve servir de desculpa para que os treinadores não levem em consideração este assunto, muitas vezes chegando ao ponto de ignorar/desvalorizar quando a atleta diz “mister, hoje não consigo treinar, estou menstruada”. Acima de tudo, é preciso mudar mentalidades, e a mudança começa através da informação e do conhecimento mais aprofundado deste tema, e por isso, decidimos hoje trazê-lo à tona.
Em fevereiro de 2020 no Jornal de Notícias, surgia a notícia “Chelsea
adapta o regime de treinos mediante o ciclo menstrual das jogadoras”. Para
muitos leitores este artigo pode ter passado despercebido, mas para quem
trabalha com o desporto no feminino este é um dos que não podemos perder e
devemos até procurar saber mais.
As equipas técnicas que acompanham atletas femininas têm a necessidade de
se adaptar e preocupar com inúmeros fatores que advêm dos aspetos fisiológicos
e biomecânicos da mulher. Se, por um lado, a anatomia da mulher favorece o
aparecimento de algumas lesões, por outro, a variação hormonal ao longo de um
ciclo menstrual afeta o desempenho cardiovascular, respiratório,
termorregulador e parâmetros metabólicos.
O ciclo menstrual apresenta duas
principais fases: fase folicular e fase luteínica. A primeira inicia-se pela
menstruação que se caracteriza por baixas concentrações de estrogénio e
progesterona, passando depois à fase proliferativa (até aos 14 dias de ciclo)
com um aumento exponencial de estrogénio, mantendo a progesterona baixas
concentrações. A fase luteínica é marcada por grandes concentrações de
progesterona, ligeira diminuição de estrogénio e aumento da temperatura
corporal basal.
Durante a fase luteínica ocorre uma diminuição na capacidade de
resistência das atletas e há uma menor contribuição glicolítica no exercício. Esta
é também a fase que antecede a menstruação e onde surgem muitas vezes sintomas pré-menstruais,
de entre os quais se destacam o aumento de processos inflamatórios e a sensação
de fadiga tendo influência direta na performance. Durante a menstruação (início
da fase folicular) os valores de concentração de lactato apresentam valores
superiores. A força e a performance de sprints não apresentaram ainda variações
evidentes ao longo do ciclo menstrual embora as atletas com a presença de
sintomas pré-menstruais expressem de forma recorrente a sensação de perda de
peso, perda de coordenação, ganho de apetite e dores musculares.
Os treinadores devem controlar as variações do desempenho que ocorrem durante o ciclo menstrual, por exemplo através da realização de testes em diferentes fases ou através do controlo da perceção subjetiva do esforço durante todo o ciclo. Tudo isto tendo como objetivo prever e diminuir as diferenças no desempenho das atletas, controlando um fator que se revela importante e diferenciador no momento competitivo.
Daniela Costa Juliana Almeida
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