A época perfeita traz títulos, conquistas e valoriza todos os agentes
desportivos envolvidos nesse percurso vitorioso. Há jogadores que saem, há
jogadores que entram e, quando as mexidas são muitas, é comum ouvir-se que “os
novos jogadores ainda estão a ambientar-se ao clube e os processos levam o seu
tempo a ser assimilados”. Como se no Futebol Profissional o tempo fosse algo
devidamente respeitado e considerado pelas afamadas Estruturas...
No entanto, o que acontece quando após uma época de glória o timoneiro
das conquistas abandona o barco juntamente com a sua equipa técnica? Seja para
abraçar um novo projecto profissional, seja porque decidiu tirar um ano
sabático, seja pelo que for. O que acontece a um clube que ganhou tudo com determinada
liderança e vê-se obrigado a encontrar um novo líder?
Surge este texto a propósito de Jorge Jesus e do Flamengo. Antes de mais,
toda e qualquer menção a Jorge Jesus será extensível à sua equipa técnica, pelo
que importa deixar isso bem claro, pois ninguém vence nada sozinho ou se não
estiver rodeado dos melhores profissionais nas suas mais diversas áreas.
Sob a égide do treinador português, o Flamengo venceu todas as
competições em que esteve envolvido a nível nacional e sul-americano, tendo
faltado apenas o Campeonato do Mundo de Clubes. Nada que belisque o excelente
trabalho desenvolvido pelo experiente treinador lusitano, o qual não se limitou
apenas a vencer, pois também convenceu até os mais cépticos.
Tudo parecia bem encaminhado para mais um ano de glória, não fosse o
Benfica ter entrado em cena e Jorge Jesus ter decidido regressar ao seu país.
Até aqui nada de novo naquilo que é o Futebol. Sai um treinador vencedor, o
clube procura o seu substituto e encontra-o. Não interessa se foi a primeira,
segunda, terceira, centésima opção. Encontra-o.
O novo treinador chega em cima do primeiro jogo oficial do campeonato,
quase não tem tempo para treinar e perde na estreia. Segue para o segundo jogo,
frente a um adversário teoricamente mais acessível, e perde. Surgem as
primeiras críticas, surgem especulações acerca de como se treinou de
determinada forma e se jogou de outra, enfim, surge tudo aquilo que podemos
facilmente imaginar, pois é de futebol que falamos.
A verdade é que, e é isso que me traz aqui hoje, quão difícil é
substituir uma equipa técnica vencedora num contexto como o do Flamengo? Porque
estamos a falar de um contexto deveras complexo.
A nível nacional o clube carioca não vencia títulos de maior importância
há mais de uma década. A nível sul-americano não vencia a Libertadores há mais
de 30 anos. Apenas os estaduais constavam do currículo recente de um dos
maiores emblemas brasileiros, algo manifestamente curto para um clube desta
dimensão. E em poucos meses tudo mudou. Para melhor claro...
A Direcção fez o seu papel, mas será que conseguimos fazer um pequeno
exercício: Quais os critérios utilizados para a escolha ter recaído em Domenec
Torrent? A experiência? O modelo de jogo? A liderança? A comunicação? O
conhecimento do futebol brasileiro?
E por falar em Torrent, quão difícil é a tarefa do treinador que se segue
ao treinador vitorioso? Quais os seus primeiros desafios? Manter o mais
possível os automatismos já assimilados pelos jogadores, os quais deram fruto
no passado recente? Para isso ele teria de saber o que se passava. Será que
sabia? Mudar tudo e procurar incutir o seu cunho pessoal o quanto antes? Para
isso teria de ter tempo de treino. Não teve.
Será que a derrota para o Atlético Mineiro de Sampaoli foi por falta de
tempo, ainda que se tenha tentado manter a matriz recentemente consagrada? E a
derrota para o Atlético Goianiense terá surgido porque se alterou tudo o que de
bom havia sido feito? E como se explica a vitória em Coritiba?
Sim, eu sei, são demasiadas questões para um texto tão pequeno. Mas por
aqui percebe-se a complexidade do assunto. Não há fórmulas mágicas nem segredos
indesvendáveis. Há, isso sim, Futebol. E ainda que haja sempre situações que
podem ser ponderadas, previstas e trabalhadas, em Futebol tudo pode acontecer.
Especialmente depois do adeus...
Laurindo Filho |
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