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O Equilíbrio no Benfica

 


Roger Schmidt chegou na época passada ao Sport Lisboa e Benfica e o paradigma encarnado mudou como do dia para a noite. As grandes noites europeias regressaram, o “rolo compressor” voltou a aparecer em jogos do campeonato e, por momentos, os adeptos benfiquistas voltaram a sonhar com a possibilidade de ver a sua equipa entre as finalistas da principal competição de clubes. Poder-se-ia falar em Guttmann e na sua maldição, mas aos dias de hoje, constata-se que há algo bem mais profundo e enraizado do que isso.

            Com o campeonato conquistado e comemorado, rapidamente se evaporaram os lamentos pela possibilidade perdida de atingir uma final da Liga dos Campeões. A partir daí, uma casa que parecia desde cedo arrumada, contratações cirúrgicas, o regresso de um diamante lapidado e esperanças de uma época de sucesso novamente renovadas.

            A vitória frente a um dos FC Porto mais acessíveis (naquele momento) da última década, acabou por mascarar alguns dos problemas que continuam a fazer sentir-se já com a época em claro andamento. Era difícil conseguir substituir Ramos ainda antes do jogo frente aos rivais, no entanto, a entrada com um ataque móvel dava desde logo sinais da pouca confiança que Schmidt tinha nos elementos disponíveis para a posição 9. Não que o mesmo desconfie do potencial e da utilidade que cada um deles possa ter para o grupo, mas nenhum estaria preparado para assumir a titularidade e reproduzir tudo aquilo que Roger necessita para que a sua ideia para o jogo floresça de uma forma bonita e crie um jardim confortável para todos.

            Os jogos seguintes viriam a provar que a equipa necessitava de alguém na frente de ataque. Mais do que necessitar de uma referência ofensiva, que nem é o caso nem me parece que seja efetivamente esse o problema (a referência em si), o que a equipa estava (e está) órfã é de alguém que consiga aliar qualidade tanto nos apoios como em diagonais curtas, uma forte capacidade, leitura e perspicácia no entendimento da forma e momentos de pressing, juntando ainda uma capacidade de movimentação dentro de área que permita a equipa procurá-lo para se adiantar no marcador por inúmeras vezes. 



          Também a partir desse jogo foi possível de verificar as contínuas dúvidas que o Treinador das águias mantinha (mantém). Aursnes, apresentou-se a jogar numa das duas posições centrais avançadas, em conjunto com Rafa, só que ao contrário do que Roger poderia almejar, o plano saiu furado ao longo de toda a primeira parte, com falta de ideias coletivas ofensivas e sem que o famoso angriffpressing resultasse minimamente. Aqui reside uma das principais dificuldades, afinal onde deverá jogar Aursnes? O jogador já passou por quase todas as posições e é uma extensão do Treinador em campo, sendo possível recuar no tempo até à conferência de imprensa da jornada 22 da época anterior, que ajuda a entender a importância que Roger lhe atribuí dentro do grupo: “Dá equilíbrio, é muito completo, consegue correr muito, é taticamente inteligente e muito fiável” e “Consegue ajustar o seu comportamento dependendo da posição em que joga, parece que pode jogar em todas as posições da frente ou meio-campo.”

            Depois de uma primeira época em que o 11 base pouco ou nada foi mexendo, tentando criar uma dinâmica de vitória desde o primeiro dia, além de um entendimento fundamental dos princípios que fariam crescer a ideia pretendida dentro de campo. Muitos foram os elogios quando ganhava de que mantinha os 11 ideais lá dentro em todos os jogos e procurava sempre a vitória e uma dinâmica ofensiva muito forte, tal como, numa fase menos positiva e fulgurante choviam críticas pela falta de rotatividade e da incapacidade de mexer na equipa durante o jogo.

            Esta época, mérito do seu trabalho na descoberta e evolução de alguns elementos, com um maior equilíbrio do plantel, chegando somente contratações cirúrgicas, o leque de opções preparadas para o 11 inicial e para colocar em prática o que o seu Treinador pretende, acabaram por aumentar.

            No parágrafo anterior reside um dos pontos que mais dificuldade tem colocado ao grupo. Apesar de uma dinâmica de vitória, ainda não se vislumbrou um jogo completo em que a equipa não acabasse por sentir dificuldades no domínio e controlo total do seu adversário. As lesões, a adaptação de novos jogadores, alguns jogadores não estarem no “top level” em determinado momento, os resultados, o emergir de novos jogadores a mostrarem-se num rendimento superior serão algumas das razões apontadas para que Roger Schmidt somente por uma vez tenha repetido o 11 inicial desde que iniciou a época. Parece-me claro que isso é demonstrativo de que o processo não está a ser implementado da forma que o Treinador pretende e que o mesmo ainda se encontra à procura do melhor 11 e da melhor dinâmica para a sua equipa.



            Ao longo de toda a pré-época o debate sobre o duplo pivôt no meio-campo (questão a ser resolvida desde a saída de Enzo) foi recorrente e esta é a primeira questão resolvida até ao momento. João Neves, apesar da tenra idade, agarrou o lugar e consegue ser provavelmente o jogador mais regular e a apresentar níveis de desempenho bastante elevados, o que até o levam a conseguir a convocatória para a Seleção de Portugal. Pelo caminho, teremos sempre Florentino à espreita e pronto a garantir outro tipo de coesão que me parece que a equipa continua carente. Além disso, no fim da casa estar arrumada, teremos Aursnes de regresso ao meio-campo?

            Continuando com as dúvidas, a lateral esquerda ficou abandonada desde a saída de Grimaldo. Quem achasse que Ristic iria garantir o lugar, cedo percebeu que com a chegada de Jurásek e o investimento feito, o mesmo seria a aposta. No entanto, o jogador não apresenta o rendimento desejado e levará mais tempo até se adaptar e demonstrar o que realmente pode valer. Por essa razão, Bernat foi contratado no fecho do mercado e será, na minha opinião, a solução para titular enquanto Jurásek cresce na sombra e sem pressão.

            Na frente de ataque saiu um jogador que entendia e encaixa perfeitamente naquilo que o Treinador pretendia. Este é o principal problema da equipa pois, está refém de uma estrela na frente de ataque e esse tipo de jogadores custa muito dinheiro e nem sempre são fáceis de encontrar. Desta forma, tal como Jurásek, Arthur Cabral chegou mais como uma segunda opção pois, parece-me que as opções que se pretendiam garantir e que estavam observadas e acauteladas para chegar, ver e vencer, se revelaram demasiado caras para os cofres encarnados. Musa, mais ao estilo Tacuara (falo do estilo, não da comparação de qualidade), é um jogador nem sempre compreendido e o seu estilo não é o mais brilhante. Tengstedt ainda não demonstrou valer o dinheiro que foi pago por ele e Cabral sendo um jogador que Roger já conhecia, chega a necessitar de tempo para se adaptar às ideias do Treinador. Fica a dúvida se realmente conseguirá fazer esquecer Ramos em breve. Será Gonçalo Guedes o futuro avançado do Benfica?

            Para a baliza, já no fim do mercado, chegou também a oportunidade de dar um upgrade á baliza e um passo em frente no estilo que a equipa pretende dentro de campo. Não haverá dúvidas em breve, de que apesar da saída de Vlachodimos, este será um upgrade e um Guarda-Redes na linha de outros casos de sucesso que o clube já teve.

            É fácil de perceber que ainda existem algumas dúvidas e alguma abertura até que o 11 ideal se consolide. São algumas posições ainda abertas até que um jogador pegue de estaca e de lá não saia mais, tal como na época transata.



          Além disso, temos a questão do equilíbrio. Na época anterior a dúvida era se Ramos e Guedes seriam compatíveis, este ano a dúvida é se Neres e Di Maria serão compatíveis. Roger Schmidt está noutra fase da sua carreira e as experiências anteriores levaram a que chegasse ao patamar em que se encontra. Isto ajuda a explicar que embora se possa sentir tentado a colocá-los em campo ao mesmo tempo, a história diz-lhe que esse tipo de futebol total poderá trazer consequências nefastas para a equipa. Principalmente enquanto a dinâmica coletiva não estiver bem consolidada. O individual poderá resolver pontualmente, mas o coletivo necessita de funcionar de outra forma. Até o individual para se apresentar constantemente ao melhor nível necessita de um maior equilíbrio da equipa. O artista vai sempre necessitar de quem lhe carregue o piano e é aqui que se encontra também um dos problemas da equipa.

            Se estivesse dentro do plantel um avançado tão forte a reagir ao momento de perda, na forma como se voluntaria e disponibiliza a correr km’s atrás da bola, haveria certamente mais possibilidades de vermos Neres/Guedes, Rafa e Di Maria em conjunto com o tal avançado. Desta maneira, o lugar acabará por pertencer a Aursnes/João Mário (pelo menos enquanto Guedes estiver de fora), de forma a garantirem um meio-campo mais povoado e a não deixar que a equipa esteja constantemente partida nos momentos em que o adversário rompe a primeira e segunda linha de pressão encarnada.

            Depois desta derrota frente ao Inter, com nova entrada com um ataque móvel, diria que o melhor é mesmo olhar para tudo isto escrito aqui e fazer o que Roger disse há pouco tempo “o melhor caminho para o sucesso é não complicar”. Há que fazer os tais ajustes que Roger falava, mas não quebrar a dinâmica que se vem a impor desde a sua chegada ao clube.

            Acredito, tal como disse Schmidt na época anterior, “para criar um equilíbrio perfeito na equipa, a janela de transferências de verão não é suficiente” e desta forma, (só se alguns jogadores rapidamente agarrarem os lugares disponíveis e ajudarem a catapultar a equipa para outros patamares de performance de excelência a que habituaram a generalidade), haverá ajustes no desenho do plantel e do 11 a serem feitos em Janeiro.

            Até lá, o equilíbrio no Benfica necessita de estabilidade e, que passada esta fase das paragens das Seleções, os melhores entrem lá dentro e repliquem aquilo que lhes é pedido. Sob pena do tribunal da Luz rapidamente se mostrar demasiado rígido e inflexível com quem tanto trouxe de alegrias nestes últimos tempos.

 “O melhor caminho para o sucesso é não complicar”.

           


Ricardo Carvalho

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