“A formulação de um problema é muito mais importante do que a sua solução” (Albert Einstein) |
O jogo de Futebol é caracterizado pela complexidade de relações criadas durante o mesmo, de oposição e de cooperação, que decorrem dos objetivos dos jogadores e das equipas, assim como do conhecimento que possuem do jogo, de si próprios e dos adversários. Com isto, é importante salientar, que hoje o jogador deve ser dotado de determinados mecanismos percetivos, devendo ser o mais eficaz e eficiente possível na sua tomada de decisão. Possuindo um reportório de grande variabilidade de resoluções táticas que permita resolver problemas provocados pelo jogo, tendo como suporte uma elevada capacidade técnica para dar resposta às soluções encontradas a esses mesmos problemas (o que fazer/ porque fazer/ quando fazer/ como fazer). Ademais, o jogador deve procurar aumentar a sua assertividade ao processar informação face as variáveis do jogo. Por último, e não menos importante, a elevada complexidade do jogo exige que o jogador seja capaz de se adaptar e antecipar diferentes problemas consequentes da imprevisibilidade que o jogo proporciona. Para isto, e cada vez mais, a observação e análise de jogo é fundamental no dia-a-dia das equipas técnicas, quer seja com uma funcionalidade departamental ou individual, mediante recursos disponíveis. Torna-se imperativo nas equipas de primeira linha, a presença de um departamento que permita aos especialistas efetuar uma observação e uma análise multidimensional do jogo e avaliar o comportamento competitivo das equipas e dos jogadores durante os jogos, que permita concretizar e caracterizar as exigências específicas que são impostas aos mesmos. Portanto, os analistas são parte fundamental de um processo que tem como finalidade a otimização do rendimento da equipa tendo como ponto de partida quer a observação e análise da própria equipa quer da equipa adversária.
- Observação e Análise do Adversário e as Perguntas a colocar à Organização Ofensiva
Nos Jogos Desportivos
Coletivos, capacidades como a técnica especifica e a tomada de decisão dependem
da forma como as mesmas são modeladas às situações de jogo, em que os jogadores
desenvolvem sequências de ações e comportamentos, mediante tomadas de decisão
encadeadas de acordo com as fases de ataque e defesa. Na essência do jogo de Futebol, uma
participação consciente é fundamental para que a dimensão tática possa ser operacionalizada pelos jogadores no terreno de jogo,
devendo estes procurar responder aos problemas que o jogo lhes proporciona
através de respostas técnico-táticas e comportamentos adaptados ao contexto e
guiados por um objetivo comum. Da mesma forma, o Futebol possui características
únicas, baseadas na imprevisibilidade, na aleatoriedade e na variabilidade de
comportamentos e ações que conferem significância à inteligência e à capacidade
de decisão dos jogadores. Posto isto, fica claro que uma área como a observação
e análise deva ser uma regra na melhoria do processo da tomada de decisão,
tanto da parte do treinador como da parte do jogador. Os recursos de um
departamento de observação e análise, vão permitir ao jogador e ao treinador
desenvolver a capacidade para processar informação de forma mais eficiente e eficaz, dada a maior capacidade em perceber, analisar
e decidir providenciada pelos
recursos. Recursos esses que dotam os jogadores e treinadores de ferramentas
que permitem antecipar cenários e criar feedbacks,
sempre numa perspetiva de preparação e melhoria de eventuais processos, de
jogo e de treino, com resposta aos problemas recorrentes do jogo.
A observação e análise
das equipas adversárias, assim como da própria equipa, é um dos fatores que
contribui para que as equipas
apresentem níveis mais elevados, existindo
uma tendência maior para a igualdade competitiva entre as equipas, pelo conhecimento que cada uma tem
relativamente à equipa adversária. A observação e a análise da equipa
adversária pretende então facilitar as tarefas do treinador, tornando os seus
processos de intervenção mais eficazes, contribuindo para o conhecimento das
características do adversário, relativamente à sua forma de jogar, à
identificação de padrões coletivos e individuais, permitindo assim a criação de
um plano para o jogo contornando desta forma eventuais surpresas. Com isto, a informação proveniente da análise
da equipa adversária pode ser utilizada no sentido de explorar as suas fraquezas e contrariar as suas valências enquanto equipa. Logo, é
importante que os intervenientes neste processo sejam capazes de estabelecer perguntas relativas ao jogar da equipa
adversária, para que possam intervir
antes e durante o jogo, com o intuito de obter respostas de uma forma
mais eficaz e eficiente, quer para a prescrição/modelação do treino, quer para
a condução do próprio jogo.
Perante tudo isto, e
abordando processos que envolvem a relação Treinador-Analista, o Analista deve
procurar sempre estar em sintonia com o Treinador, no que toca à observação e
análise do jogo da equipa adversária, utilizando para isso as ‘lentes’ que habitualmente
o Treinador utiliza. Quer isto dizer, que é fundamental a definição de um
modelo de observação e análise da equipa adversária, que sirva como linha
orientadora do processo, à semelhança do modelo com perguntas estruturadas
apresentado no parágrafo seguinte.
Organização
Ofensiva: Qual o seu método de jogo utilizado: contra-ataque,
ataque rápido, ataque posicional? Qual é a estrutura ofensiva? Existe alteração
da estrutura ofensiva com o decorrer do jogo? Existe um padrão (jogo direto,
jogo indireto, jogo curto/ longo)? Que regularidades tem o GR? Como é a execução do GR a jogar com os pés? O
GR tem dificuldade a jogar sob pressão? Como é que a equipa sai a jogar? São
objetivos ou tentam elaborar? Quando é que saem a jogar curto ou longo? Com pressão alta tem inicio longo ou curto? Correm
riscos? São eficazes quando pressionados? Como se posicionam os seus jogadores?
Como são as dinâmicas dos jogadores (como por exemplo, se os centrais abrem e
médio defensivo baixa, se os laterais projetam ou se ficam abertos para
circular, etc…)? Existe referência de saída (jogador vs espaço dentro vs espaço
fora)? Qual é a referência de saída? Perceber qual ou quais os corredores mais
utilizados de forma preferencial? Qual o corredor em que são mais perigosos? Como
é o posicionamento do bloco ofensivo no momento de saída curta e longa? Qual o
pé forte dos jogadores para orientar a pressão em função disso em alguns casos?
Existe algum jogador com o pé preferencial inverso ao seu lado posicional?
Existe alguma referência para jogo longo? Como é a capacidade do jogo áereo do
adversário? Se for longo deixam o adversário ganhar a primeira bola e tentam
ficar com a segunda / tentam ganhar ambas / deixam ambas para o adversário? Se
convidarmos a jogar longo para o lateral ele tem condições para rececionar?
Quem são os jogadores que dão continuidade ao jogo? Quais os jogadores preponderantes nesta fase
(central que toma a iniciativa na construção de jogo, médio defensivo que se
movimenta bem e que ao conseguir virar de frente para o jogo consegue acelerar
e fazer passes importantes que ultrapassam linhas, quais os médios que recuam
mais para construir jogo e onde, qual o médio mais ofensivo e que joga mais
entre linhas ou mesmo em profundidade, dinâmicas dos extremos dentro ou fora,
movimentos do Ponta, etc…)? Perceber o mapeamento padrão do(s) jogador(es) mais
preponderante(s) para tentar na estratégia de jogo coletiva da nossa equipa
anular as suas melhores qualidades? Preferências no inicio de construção em
situação de jogo corrido? Como é que procuram construir/criar? Constroem preferencialmente
por fora ou por dentro? Constroem em progressão, passe, movimentos de jogadores
da linha média, movimentos de jogadores da linha avançada? A equipa procura
jogar em apoio? A equipa procura jogar direto para um corredor? A bola chegando
ao lateral há movimentação do interior em rutura ou em apoio? Existe
aproximação do avançado? Existe movimentação do avançado para atrair e procurar
espaço interior? Os laterais projetam-se? Existem movimentos interiores dos alas?
´ Existe variação do centro do jogo – atrair de um lado para jogar do outro? A orientação dos jogadores é para frente ou para trás? O jogo é mais vertical ou mais circular? A equipa sente-se confortável quando tem a bola? Como é a capacidade técnica dos médios no passe curto vs passe longo? Como é a capacidade dos médios na condução de bola? Qual o médio de referência para os desequilíbrios? Qual o médio de referência para o ultimo passe? Existe algum momento de aceleração? Como se desenvolve e onde o momento de aceleração? Algum jogador específico ou que seja uma mais valia no momento de aceleração? A equipa revela eficácia nesta fase? Qual o corredor que utilizam preferencialmente para chegar ao último terço do terreno? Qual o número de elementos envolvidos em profundidade? Quem são os jogadores que desequilibram no 1x1 pelo corredor lateral? Qual o pé forte dos jogadores mais desequilibradores? Quais os movimentos preferenciais dos jogadores mais desequilibradores? A equipa procura finalizar após cruzamentos, combinações, desmarcações para espaços livres? Existe algum jogador referência nos últimos passes? Existe envolvimento dos laterais no momento de cruzamento? Quais os jogadores que mais frequentemente entram na zona de finalização? Quantos jogadores colocam dentro da área e nas zonas circundantes? Existe algum jogador referência no jogo aéreo? Existe algum jogador referência para receber últimos passes? Existem arrastamentos propositados para a criação de espaços livres para finalizar? Existe variabilidade nas entradas no espaço? Procuram finalizar de longa/média distância? Como é que estão equilibrados neste momento? Quem são os elementos em equilíbrio defensivo? Existe algum espaço que possamos explorar após este momento? Neste momento protegem eventuais segundas bolas? Como reagem os jogadores após a perda da bola? Como alteram este momento em função do resultado? Como funciona este momento em função da equipa jogar fora ou em casa?
Cada
vez mais vivemos consumidos tanto na sociedade, como no Futebol, literalmente,
pelo excesso de informação. Informação sobre tudo, sobre nada, relevante e
irrelevante, interessante e desinteressante, útil e inútil. No Futebol
esse mesmo excesso de informação, faz-se acompanhar pela escassez de tempo, que é uma condicionante existente no Futebol, dado o número acentuado de competições, sendo este
um fator que condiciona o planeamento dos intervenientes, quer dentro, quer
fora do treino. Posto isto, é importante que os intervenientes no processo de
observação e análise do jogo e prescrição/modelação do treino, nomeadamente
analistas e treinadores, sejam capazes de analisar e selecionar todas estas
perguntas que podem fazer ao jogo do adversário. Com o intuito de priorizarem
as perguntas que considerem fundamentais a colocar ao jogo do adversário, com a
clara intenção de recolher as respostas de maior utilidade na preparação do
adversário, tornando o processo de treino e de jogo mais assertivo na
reprodução da competição em causa.
Esta premissa torna-se fundamental no plano de ação desses
mesmos intervenientes. E como habitualmente é mencionado, quando queremos ver
tudo, não conseguimos ver nada, e no jogo de Futebol apenas vemos o que estamos
preparados para ver. Por isso mesmo, é importante, enquanto intervenientes no
Futebol, termos pré-definido o que queremos ver, para que possamos estar mais
dotados de eventuais mecanismos de antecipação que nos permitem estar cada vez
mais preparados para a elevada complexidade do jogo de Futebol.
João Pereira
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