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Ficar a querer sair


Que tipo de mensagem passa um líder aos seus liderados quando publicamente ameaça sair e bater com a porta? Seja por falta de resultados, por falta de coesão interna ou por qualquer outro motivo, qual o verdadeiro impacto de uma tomada de posição desta natureza, quer a nível interno, quer a nível externo?
Se tivermos em consideração um universo mais restrito, basta olharmos para o Futebol Português para facilmente detetarmos três situações em que os líderes dos respetivos projetos futebolísticos (no que ao trabalho de campo diz respeito) disseram de sua justiça e expressaram-se publicamente, dando conta não só da sua insatisfação, como também do seu desejo em abandonar os seus liderados.
Porque mais do que abandonar clube, estrutura, acionistas ou adeptos, o que um Treinador de Futebol faz quando assume publicamente que vai/quer colocar o seu lugar à disposição, é abandonar os seus liderados. E isso, a meu ver, tem consequências graves e nefastas.
Carlos Carvalhal foi o primeiro a fazê-lo. Disse-o a quente, numa flash interview, após ser eliminado do acesso à Final Four da Taça da Liga. Disse-o por se sentir vilependiado e impedido de alcançar um dos seus objectivos para a presente época. Seus, leia-se, do clube e não apenas dele e da sua equipa técnica.
Mas ao dizê-lo da forma que disse, mesmo que eventualmente viesse a ter razão ou estivesse coberto de razão, a verdade é que Carvalhal deu um sinal claro para dentro do seu grupo de trabalho: se os obstáculos forem inultrapassáveis e as barreiras constantes nos impedirem de chegar onde queremos, mais vale sair, porque não estou para isso!
Sejamos sinceros... todos temos direito a ter reacções menos lógicas quando estamos de cabeça quente, mas todos temos igualmente o dever de utilizar a nossa Inteligência Emocional, de modo a adequar as nossas reações aos mais variados contextos em que nos encontramos, tendo em conta aquilo que sentimos naquele preciso momento ou naquele determinado instante.
É preciso sangue frio e uma excelente capacidade de análise e auto-domínio? É, claro que sim. Isso significa que Carlos Carvalhal não tem essa capacidade? Não, claro que não. Mas naquele momento não a teve e isso poderá vir a ter implicações futuras na gestão do balneário e do seu grupo de trabalho. Especialmente se as coisas não correrem conforme o planeado. Como poderá ele exigir superação e transcendência aos seus jogadores nos momentos mais difíceis quando ele, ao primeiro revés, disse o que disse?


Sérgio Conceição após a derrota frente ao SC Braga na final da Taça da Liga também não teve essa capacidade nem esse auto-domínio. Todos sabemos que se trata de um treinador temperamental e de gatilho rápido no que toca a reações a quente, mas as declarações veiculadas na conferência de imprensa que sucedeu ao jogo foram demasiado gravosas ao nível da liderança para que não se analisem as mesmas.
Imaginem-se jogadores do FC Porto. Imaginem-se a ouvir o vosso líder, enquanto treinador, a dizer que coloca o lugar à disposição? A dizer que falta união no seio do clube? Com que cara iriam olhar para ele no treino seguinte? Ser-vos-ia fácil acatar as suas indicações e decisões, independentemente de vos afetarem mais diretamente ou não?
Uma vez mais houve falta de Inteligência Emocional. Não é ser redundante, é ser realista. A Inteligência Emocional ajuda-nos a lidar com as nossas emoções. Não se trata de as camuflar ou de as esconder e Conceição dificilmente seria capaz de o fazer, tendo em conta o seu perfil, mas sim de saber lidar com elas e de as utilizar em prol das nossas tomadas de decisão.
Um líder, seja ele quem for e em que local estiver a desenvolver a sua liderança, nunca deve esquecer que um dos seus maiores e mais inestimáveis contributos é o da agregação. Um líder tem de agregar, unir as suas tropas, independentemente dos ventos, das marés e das tempestades. Porque quando as coisas correm bem, por norma, a liderança acaba por estar assegurada. Mas quando correm mal ela necessita de ser legitimada. E se para haver líderes é preciso haver liderados, como pode um líder querer abandonar os seus liderados?
Daí questionar a atitude de Augusto Inácio, recém-nomeado treinador do Avaí, do Brasil. Poucas semanas de trabalho, adaptação a uma realidade que não conhece, dificuldade na construção do plantel e já veio para a Comunicação Social dizer que se não houver reforços...sai?
Então, mas uma nova aventura não significa correr riscos, assumi-los e partir à descoberta, não só da nova realidade em si, mas igualmente de si mesmo, da sua capacidade em liderar (ser líder de algo) em condições adversas? Ou só se é líder quando o panorama está minimamente dentro daquilo que pretendemos e idealizamos?
Como não poderia deixar de ser, novo caso de falta de Inteligência Emocional. E pior do que isso, novo caso de falta de capacidade de liderança. E enquanto uns saem a querer ficar, outros ficam a querer sair. É Futebol, diz o Povo. Talvez seja, mas não o meu...


Laurindo Filho

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