“Agora decido eu!” Quantas vezes
não olhamos para os nossos jogadores durante uma partida de Futebol e, em
determinados contextos, identificamos duas ou três opções viáveis e de fácil
tomada de decisão, mas depois vemos que a opção tomada acabou por ser a mais
complexa e a jogada até prosseguiu com qualidade?
E quantas
vezes não estamos a “prever” aquele ataque rápido organizado que foi trabalhado
de forma exaustiva durante dois meses, no qual sabemos que o último passe vai
entrar ali naquele timing específico…mas depois o jogador decide de outra forma,
desacelera e acaba por fazer o último passe além do tempo que imaginámos, de
uma maneira que nem sequer imaginámos…sendo que a jogada termina da maneira que
mais nos interessa, ou seja, em golo?
Pois é, pode
parecer estranho, mas acontece de forma amiúde, não acontece? Sabem porquê?
Porque por muito que possamos traçar e identificar cenários na nossa cabeça,
por muito que possamos trabalhar as coberturas defensivas, os sistemas de
compensações, as rotinas ofensivas, tudo ao milímetro, tudo até ao mais ínfimo
pormenor, há sempre algo que nos “escapa” aquando de todo o nosso processo de
criação e operacionalização dos treinos: o livre arbítrio dos Jogadores!
Isto significa
que a tomada de decisão pertence aos Jogadores. Por muito que possamos
trabalhar, repetir e insistir em pormenores que são sempre “pormaiores”, a
decisão final de toda e qualquer acção respeitante ao jogo cabe e caberá sempre…aos
Jogadores. Não há como fugir a isso! E quem não o conseguir perceber, irá
perder certamente muito do seu tempo de sono a tentar entender os quê’s e os
porquê’s que levam os seus jogadores a nem sempre fazerem aquilo que foi
meticulosamente trabalhado…
Eu também já
perdi horas de sono a tentar perceber a razão para o Jogador A não surgir na
zona x quando o Jogador B cruzava da zona y…Sou sincero e não me custa
admiti-lo. No meu primeiro ano como Treinador Principal passava horas a ver e a
rever mentalmente os treinos e os jogos, sempre à procura de uma pista que me
ajudasse a decifrar o tal mistério que impedia a jogada treinada de se
concretizar em contexto competitivo.
Foram muitas
as horas passadas nessa espécie de flashback mental. E após cada análise
exaustiva, lá íamos nós trabalhar ainda mais, repetir ainda mais, fazer tudo
ainda mais, mas nem sempre com os resultados por mim idealizados…
Era óbvio que
algo me escapava. Até que num determinado dia, ao ler uma entrevista, descobri
um pensamento que iluminou o meu pensamento: “Mais importante do que a repetição
constante e incessante do movimento x e/ou da rotina y, é a capacidade de
fornecer aos jogadores o maior número de caminhos possíveis em/perante
determinados contextos. Porque em jogo, e na hora da verdade, é ao Jogador que
cabe a tomada de decisão.”
E eis que
então fez-se Luz! Comecei a rever tudo sob um outro prisma. Um novo prisma. Uma
prisma que me fez perceber que por muito que eu quisesse que os Jogadores
decidissem num determinado sentido, eles poderiam muito bem decidir num sentido
diferente…umas vezes oposto e inconsequente, outras vezes oposto e com o
sucesso que eu havia desejado e imaginado na minha cabeça…mas por outros
caminhos.
Desde então
tenho sido um Treinador muito mais desperto para esta forma de pensar e
operacionalizar o treino. Tenho, conjuntamente com todos aqueles que me ajudam
e colaboram comigo, procurado dotar os Jogadores do maior número de “armas”
suficientes para que eles possam encarar cada “batalha” (jogo) com a sensação
de estarem devidamente munidos e preparados para o combate.
É óbvio que ao
nível em que ainda me encontro é muito difícil seguir esta linha de pensamento,
principalmente se tivermos em conta que nem sempre é possível ter todo o
plantel à disposição dos três ou quatro treinos semanais que compõem o nosso
microciclo. Mas também me parece óbvio que este é o caminho mais rico, mais
sensato e mais sincero para com o nosso trabalho enquanto Treinadores e para
com aqueles que nos ajudam a materializar as nossas ideias – os Jogadores.
Se as decisões
finais dependem deles, de que nos vale insistir que, quando a bola entra no
corredor lateral ofensivo, o Jogador deve fazer “assim ou assado”? De que nos
vale massacrar insistentemente o Lateral Esquerdo para que coloque a bola no
segundo poste se o Extremo Direito raramente “entra” ao segundo poste, razão
pela qual o Lateral Esquerdo opta quase sempre pela temporização ou por mais
uma finta?
Não será
melhor identificar o maior número de contextos possíveis e apresentar aos
jogadores o maior número de soluções possíveis, visto que a decisão está e
estará sempre nas suas mãos? Até porque, como diria o Coach K, “I have a plan of action, but the game
is a game of adjustments”…
Por muito que
o Treinador defina a rota, é o Jogador que escolhe o caminho. Sempre…
Laurindo Filho
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