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Liderar (Parte II)


A realidade que envolve um Treinador deve moldar a sua forma de Liderança. Tal como um indivíduo em processo de socialização, um Líder está sempre em evolução, num processo contínuo de adaptação e construção em que a realidade gere as necessidades. Perante os dados recolhidos, adapto as formas de abordagem dentro daquilo que me contextualiza enquanto Líder e que me identifica com qualquer tipo de modelo de Liderança.
Para mim essa é a base para executar o plano de intervenção, atentando que tudo isto cria a identidade da equipa e que os seus elementos são parte integrante dessa identidade. Na minha experiência pessoal, alargando um pouco o raio de informações necessárias e generalizando um pouco mais cada ponto, tenho em atenção especial os seguintes factores da realidade que me espera:

- Tempo de execução;
- Objectivos exequíveis;
- Número de elementos do grupo;
- Formação pessoal de cada elemento do grupo;
- Experiência de cada elemento do grupo;
- Ambição de cada elemento do grupo;
- Condições de trabalho;
- Religião;
- Aniversários ou datas especiais da Instituição e elementos do grupo;
- Idade de cada elemento do grupo;
- Percepção do sentido de humor ou personalidade competitiva de cada elemento do grupo;
- Realidade envolvente;
- Educação e cultura desportiva de quem me é superior;

Estes pontos são cruciais para a formação da abordagem do Líder, colocando a diferenciação de tratamento e do modelo adoptado. Um Líder não pode ser amigável e relaxado com um indivíduo que naturalmente já é pouco produtivo, acabando por ser adormecido por uma postura passiva por parte de quem deve promover uma reacção. No entanto, numa situação em que um indivíduo é extremamente sensível e vive em constante pressão, não reagindo da melhor forma a essa pressão, necessita de uma acção diferenciada por parte do Líder, de forma a poder extrair a qualidade do atleta em vez de a ver continuamente a ser bloqueada pela sua personalidade. Esta diferenciação de acção de um Líder é um dos inúmeros exemplos que podem ser dados relativamente às alterações comportamentais de um Líder derivado de um dado da realidade encontrada.
Todos os objectivos de um Líder devem estar identificados com o programa e agenda da Organização/Instituição, não só no sentido produtivo, mas também nos ideais, políticas e formas de comunicação, para que sejam promovidos os valores em comunhão geral.
Na fase de adaptação, os elementos da equipa são aqueles que mais devem centrar o foco do Líder, no sentido de assimilar o máximo de informação e filtrar o que poderá ser importante e crucial para que possa definir as abordagens e as adaptações que deve tomar. Este passo não só cria empatia entre o grupo e o Líder, por entender que não são meros subordinados, como também cria uma maior e mais rápida identificação do Líder com o projecto e a sua realidade.
Numa Liderança a estabilidade é crucial e os comportamentos iniciais devem definir toda a identidade de liderança futura, mostrando estabilidade e seriedade em todos os passos, e uma linha comportamental identificativa, sem desníveis comportamentais ou incongruências. A primeira imagem cria empatias ou o inverso, no entanto a estabilidade de acção ajuda a que a identificação futura entre o Líder e a sua equipa seja facilitada.
Um Líder está sempre sob avaliação dos seus liderados e mesmo na hora do sucesso as suas acções são cruciais para que se mantenha a estabilidade e o contentamento de todo o grupo. Há a velha máxima de na hora da derrota a culpa deve ser assumida pelo Líder e na hora da vitória os louros devem ser dados ao grupo, no entanto defendo que um bom Líder é aquele que é chamado pelo grupo na hora da vitória e que recebe a solidariedade do grupo na hora de assumir as culpas.



Errar é humano e um líder erra, no entanto, a reacção ao erro pode também diferenciar um bom Líder de um mau Líder, havendo erros que desde logo limitam o papel a desempenhar. Aprender e evoluir com o erro, de forma a aperfeiçoar o seu estilo e modelo é essencial e nunca deve ser esquecido no Processo de Liderança.
Os erros mais comuns de um Líder na componente Teórica de Treino são:

- Não estudar;
- Não prever;
- Não projectar;
- Não ter um plano B;
- Não identificar a realidade envolvente;
- Criar objectivos diferenciados da equipa;
- Não se integrar;
- Não assimilar;
- Não evoluir;
- Não ter capacidade de adaptação;

Os erros mais comuns de um Líder na componente Prática de Treino são:

- Falta de comunicação;
- Falta de partilha de qualquer tipo de avaliação individual;
- Tratamento diferenciado na exigência de execução;
- Falta de honestidade;
- Não confiar nos seus liderados;
- Não conseguir isolar o ambiente pessoal enquanto realidade profissional;
- Não agir consoante o que exige junto do seu grupo;
- Ter comportamentos irregulares;
- Ser sempre negativista;
- Criticar constantemente de forma destrutiva;

Tornando isto mais pessoal, ao longo da minha vida fui tendo diferentes experiências enquanto Líder, todas elas em realidades diferentes e todas elas com lições e características diferentes.
Liderar ou lidar com egos é uma ginástica mental. Um ego ferido e mal resolvido pode ser equiparado a uma erva daninha, promove a descrença, a dúvida e aumenta a sensibilidade de todos os outros elementos. Como refere Grant, um Líder deve ser prático na sua abordagem a qualquer situação que ameace a estabilidade e a vivência saudável do seu grupo, sempre com o interesse maior de proteger estes pontos. Graças a isso aprendi que, mesmo podendo estar errado e poder voltar a aprender que não é assim que se deve proceder, ao chegar a uma situação de inoperabilidade e não ter a capacidade de resolução de um problema e ao ter que manter a estrutura de trabalho (seja por motivos contratuais ou por importância desportiva), integro o grupo no problema, com o objectivo de fazer com que o grupo se sinta uma família, com importância em todas as vivências e acções do grupo, de modo a passar a mensagem que evito sempre criar qualquer tipo de injustiça, em defesa da estabilidade.
Enquanto Líder, sempre quis que o que peço me fosse auto-exigido, com o objectivo de nunca poder ter um dedo apontado quando quero resolver um problema ou simplesmente exigir algo a um elemento. Ao ser assim também tenho o poder de exigir junto dos atletas essa auto-exigência. O nível de exigência só pode corresponder ao nível de envolvimento com as regras, políticas e formas respeitosas de estar em todo o ambiente e realidade do grupo, criando a noção de que faltando ao respeito ao Líder se está a faltar ao respeito a toda a vivência do grupo, como testemunha Paulo Bento, “quando falham (os atletas) e pensam que estão a faltar ao respeito ao Treinador, está errado, porque em primeiro lugar é sempre ao colega”.       
Ao chegar a um projecto tenho sempre em atenção o passado, não deixando de o estudar e procurar mostrar isso mesmo para com os elementos do grupo. Nesse aspecto também uma identificação e caracterização individual de cada elemento é importante, pois ajuda-me a ter o conhecimento da fraca afluência aos treinos ou da pouca capacidade de sofrimento ou compromisso por parte de um ou outro atleta.


Na minha última experiência no Bahrein, decidi ter uma postura angariadora, pouco identificada com a posição de Líder, mas sim de guia inspirador, com o objectivo de os servir para que possam ser capazes de ser melhores todos os dias. Não os mando treinar, apenas peço que assim seja, se aparecerem conseguem os objectivos pretendidos, se não aparecerem não me ajudam a ajudar. De forma dissimulada, mudei a imagem de um Líder, posição estranha no dia-a-dia de adultos que sempre tiveram empregados e tudo dado de forma facilitada, adversos a receber ordens ou exigências. O plano B era ser duro, cortar com o passado, se não querem haverá quem queira e assim sendo estão excluídos, no entanto, felizmente, o plano A surtiu efeito e, embora em todas as sessões de treino tivesse uma ou duas ausências fruto das suas vidas profissionais, não me posso queixar da adesão ao período de treino por parte de todos os atletas.
Fazer alguém acreditar nas nossas palavras quando partimos do desconhecido é algo que necessita de muito trabalho, mas também de uma ponta de sorte. No meu caso esse empurrão foi vencer a China em Futebol de Praia nos Asian Beach Games, em Novembro de 2014, quando tomei a decisão de pedir a um jogador lesionado que tinha que fazer um esforço extra porque era ele que podia fazer a diferença. Jogou os últimos dois minutos e, sorte ou intuição, marcou o golo do empate e fez a assistência do golo da vitória.
A minha evolução enquanto Líder certamente nem a meio vai, tenho objectivos para evoluir e tenho ideias de como o fazer, mesmo usando e abusando de literatura, o trabalho de campo é sem dúvida o maior passo evolutivo que posso ter. Como tal tenho observado muito, sempre que tenho essa possibilidade, diferentes formas de trabalho de colegas, diferentes formas de Liderança e diferentes formas de reacção. No entanto, e avaliando pelo caminho trilhado e pelo grau de aceitação de todos os jogadores que tiveram a humildade e capacidade de me ensinar e processar a minha construção, estou certo que acertei mais vezes do que errei e sempre que errei procurei aprender e apontar de forma a nunca me esquecer esse mesmos erros. 

                                                                         João Almeida



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