A realidade que envolve um Treinador deve moldar a
sua forma de Liderança. Tal como um indivíduo em processo de socialização, um
Líder está sempre em evolução, num processo contínuo de adaptação e construção
em que a realidade gere as necessidades. Perante os dados recolhidos, adapto as
formas de abordagem dentro daquilo que me contextualiza enquanto Líder e que me
identifica com qualquer tipo de modelo de Liderança.
Para mim essa é a base para executar o plano de
intervenção, atentando que tudo isto cria a identidade da equipa e que os seus
elementos são parte integrante dessa identidade. Na minha experiência pessoal,
alargando um pouco o raio de informações necessárias e generalizando um pouco
mais cada ponto, tenho em atenção especial os seguintes factores da realidade
que me espera:
- Tempo de execução;
- Objectivos exequíveis;
- Número de elementos do grupo;
- Formação pessoal de cada elemento
do grupo;
- Experiência de cada elemento do
grupo;
- Ambição de cada elemento do grupo;
- Condições de trabalho;
- Religião;
- Aniversários ou datas especiais da
Instituição e elementos do grupo;
- Idade de cada elemento do grupo;
- Percepção do sentido de humor ou
personalidade competitiva de cada elemento do grupo;
- Realidade envolvente;
- Educação e cultura desportiva de
quem me é superior;
Estes pontos são cruciais para a
formação da abordagem do Líder, colocando a diferenciação de tratamento e do
modelo adoptado. Um Líder não pode ser amigável e relaxado com um indivíduo que
naturalmente já é pouco produtivo, acabando por ser adormecido por uma postura
passiva por parte de quem deve promover uma reacção. No entanto, numa situação
em que um indivíduo é extremamente sensível e vive em constante pressão, não
reagindo da melhor forma a essa pressão, necessita de uma acção diferenciada
por parte do Líder, de forma a poder extrair a qualidade do atleta em vez de a
ver continuamente a ser bloqueada pela sua personalidade. Esta diferenciação de
acção de um Líder é um dos inúmeros exemplos que podem ser dados relativamente
às alterações comportamentais de um Líder derivado de um dado da realidade
encontrada.
Todos os objectivos de um Líder devem estar
identificados com o programa e agenda da Organização/Instituição, não só no
sentido produtivo, mas também nos ideais, políticas e formas de comunicação,
para que sejam promovidos os valores em comunhão geral.
Na fase de adaptação, os elementos da equipa são
aqueles que mais devem centrar o foco do Líder, no sentido de assimilar o
máximo de informação e filtrar o que poderá ser importante e crucial para que
possa definir as abordagens e as adaptações que deve tomar. Este passo não só
cria empatia entre o grupo e o Líder, por entender que não são meros
subordinados, como também cria uma maior e mais rápida identificação do Líder
com o projecto e a sua realidade.
Numa Liderança a estabilidade é crucial e os
comportamentos iniciais devem definir toda a identidade de liderança futura,
mostrando estabilidade e seriedade em todos os passos, e uma linha
comportamental identificativa, sem desníveis comportamentais ou
incongruências. A primeira imagem cria empatias ou o inverso, no entanto a
estabilidade de acção ajuda a que a identificação futura entre o Líder e a sua
equipa seja facilitada.
Um Líder está sempre sob avaliação dos seus
liderados e mesmo na hora do sucesso as suas acções são cruciais para que se
mantenha a estabilidade e o contentamento de todo o grupo. Há a velha máxima de
na hora da derrota a culpa deve ser assumida pelo Líder e na hora da vitória os
louros devem ser dados ao grupo, no entanto defendo que um bom Líder é aquele
que é chamado pelo grupo na hora da vitória e que recebe a solidariedade do
grupo na hora de assumir as culpas.
Errar é humano e um líder erra, no entanto, a reacção
ao erro pode também diferenciar um bom Líder de um mau Líder, havendo erros que desde logo limitam o papel a desempenhar. Aprender e evoluir
com o erro, de forma a aperfeiçoar o seu estilo e modelo é essencial e nunca
deve ser esquecido no Processo de Liderança.
Os erros mais comuns de um Líder na componente
Teórica de Treino são:
- Não prever;
- Não projectar;
- Não ter um plano B;
- Não identificar a realidade envolvente;
- Criar objectivos diferenciados da equipa;
- Não se integrar;
- Não assimilar;
- Não evoluir;
- Não ter capacidade de adaptação;
Os erros mais comuns de um Líder na componente
Prática de Treino são:
- Falta de comunicação;
- Falta de partilha de qualquer tipo
de avaliação individual;
- Tratamento diferenciado na
exigência de execução;
- Falta de honestidade;
- Não confiar nos seus liderados;
- Não conseguir isolar o ambiente
pessoal enquanto realidade profissional;
- Não agir consoante o que exige
junto do seu grupo;
- Ter comportamentos irregulares;
- Ser sempre negativista;
- Criticar constantemente de forma
destrutiva;
Tornando isto mais pessoal, ao
longo da minha vida fui tendo diferentes experiências enquanto Líder, todas
elas em realidades diferentes e todas elas com lições e características
diferentes.
Liderar ou lidar com egos é uma
ginástica mental. Um ego ferido e mal resolvido pode ser equiparado a uma erva
daninha, promove a descrença, a dúvida e aumenta a sensibilidade de todos os
outros elementos. Como refere Grant, um Líder deve ser prático na sua abordagem
a qualquer situação que ameace a estabilidade e a vivência saudável do seu
grupo, sempre com o interesse maior de proteger estes pontos. Graças a isso aprendi que, mesmo podendo estar errado e poder voltar a aprender que não é
assim que se deve proceder, ao chegar a uma situação de inoperabilidade e não
ter a capacidade de resolução de um problema e ao ter que manter a estrutura de
trabalho (seja por motivos contratuais ou por importância desportiva), integro
o grupo no problema, com o objectivo de fazer com que o grupo se sinta uma
família, com importância em todas as vivências e acções do grupo, de modo a passar a
mensagem que evito sempre criar qualquer tipo de injustiça, em defesa da
estabilidade.
Enquanto Líder, sempre quis que o
que peço me fosse auto-exigido, com o objectivo de nunca poder ter um dedo
apontado quando quero resolver um problema ou simplesmente exigir algo a um
elemento. Ao ser assim também tenho o poder de exigir junto dos atletas essa
auto-exigência. O nível de exigência só pode corresponder ao nível de
envolvimento com as regras, políticas e formas respeitosas de estar em todo o
ambiente e realidade do grupo, criando a noção de que faltando ao respeito ao
Líder se está a faltar ao respeito a toda a vivência do grupo, como testemunha
Paulo Bento, “quando falham (os atletas) e pensam que estão a faltar ao
respeito ao Treinador, está errado, porque em primeiro lugar é sempre ao
colega”.
Ao chegar a um projecto tenho sempre em atenção o passado,
não deixando de o estudar e procurar mostrar isso mesmo para com os elementos
do grupo. Nesse aspecto também uma identificação e caracterização individual de
cada elemento é importante, pois ajuda-me a ter o conhecimento da fraca
afluência aos treinos ou da pouca capacidade de sofrimento ou compromisso por
parte de um ou outro atleta.
Na minha última experiência no Bahrein, decidi ter uma
postura angariadora, pouco identificada com a posição de Líder, mas sim de
guia inspirador, com o objectivo de os servir para que possam ser capazes de
ser melhores todos os dias. Não os mando treinar, apenas peço que assim seja,
se aparecerem conseguem os objectivos pretendidos, se não aparecerem não me
ajudam a ajudar. De forma dissimulada, mudei a imagem de um Líder, posição
estranha no dia-a-dia de adultos que sempre tiveram empregados e tudo dado de
forma facilitada, adversos a receber ordens ou exigências. O plano B era ser
duro, cortar com o passado, se não querem haverá quem queira e assim sendo
estão excluídos, no entanto, felizmente, o plano A surtiu efeito e, embora em todas
as sessões de treino tivesse uma ou duas ausências fruto das suas vidas
profissionais, não me posso queixar da adesão ao período de treino por parte de
todos os atletas.
Fazer alguém acreditar nas nossas palavras quando partimos
do desconhecido é algo que necessita de muito trabalho, mas também de uma ponta
de sorte. No meu caso esse empurrão foi vencer a China em Futebol de Praia nos
Asian Beach Games, em Novembro de 2014, quando tomei a decisão de pedir a um
jogador lesionado que tinha que fazer um esforço extra porque era ele que podia
fazer a diferença. Jogou os últimos dois minutos e, sorte ou intuição, marcou o
golo do empate e fez a assistência do golo da vitória.
A minha evolução enquanto Líder certamente nem a meio vai,
tenho objectivos para evoluir e tenho ideias de como o fazer, mesmo usando e
abusando de literatura, o trabalho de campo é sem dúvida o maior passo
evolutivo que posso ter. Como tal tenho observado muito, sempre que tenho essa
possibilidade, diferentes formas de trabalho de colegas, diferentes formas de Liderança
e diferentes formas de reacção. No entanto, e avaliando pelo caminho trilhado e
pelo grau de aceitação de todos os jogadores que tiveram a humildade e
capacidade de me ensinar e processar a minha construção, estou certo que
acertei mais vezes do que errei e sempre que errei procurei aprender e apontar
de forma a nunca me esquecer esse mesmos erros.
João Almeida
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