Como pode um
Treinador Profissional não aproveitar “aquilo” que de mais precioso existe num
jogador de Futebol? Como pode um Treinador Profissional desperdiçar “aquilo”
com que grande parte dos Treinadores Amadores deseja poder trabalhar, mas ao
qual apenas uma pequena minoria consegue ter acesso? Refiro-me à Inteligência
Futebolística, claro está!
A caminho da
minha sétima temporada como Treinador Principal, Deus sabe o quanto tenho
lutado e trabalhado para, juntamente com os Treinadores que trabalham comigo
diariamente, poder dotar os nossos jogadores de mais e melhor Inteligência
Futebolística. Dos exercícios mais simples e analíticos à sistematização mais
complexa e mais aproximada da Periodização Táctica, passando ainda pela
Descoberta Guiada, muitos têm sido os caminhos percorridos por mim e pelas
minhas Equipas Técnicas para conseguirmos potenciar os nossos atletas do ponto
de vista técnico-táctico...potenciando primeiramente a sua Inteligência Futebolística.
Ou não fosse o “pensar” o primeiro e mais importante de todos os actos...
E, no entanto,
existem Treinadores Profissionais que parecem não saber aproveitar a
Inteligência Futebolística de alguns dos seus jogadores. Existem Treinadores
Profissionais que parecem desprezar a Inteligência Futebolística de alguns dos
seus jogadores em detrimento de outros que correm mais, saltam mais e “batem”
mais...o que não significa propriamente correr melhor, saltar melhor e “bater”
melhor.
Sem ter que me
esforçar em demasia, lembro-me facilmente de quatro jogadores que, em momentos
distintos das suas carreiras e em
diferentes clubes, viram a sua mais-valia “intelecto-futebolística” ser
desprezada pelo líder do grupo a que pertenciam...
Figura de proa
do Moreirense na primeira metade da época 2016/2017, principal municiador de um
ataque encabeçado por Daniel Podence e artista maior de um conjunto que
conseguiu a proeza de conquistar a Taça da Liga (vencendo SL Benfica e SC
Braga, convém não esquecer), Francisco Geraldes é um caso único e suis generis
no Futebol Nacional.
Resgatado no “Mercado
de Inverno” pelo Presidente Bruno de Carvalho, mas contra a vontade do
Treinador Jorge Jesus, Francisco Geraldes está a “pagar” precisamente isso: não
foi escolha do Treinador, não joga. A meu ver, essa é a única razão pela qual o
jovem centro-campista não joga. Não tem a ver com o Modelo de Jogo, não tem a
ver com o Sistema Táctico nem tão pouco com a suposta falta de intensidade
(aquela terminologia famosa que todos usam, mas que ninguém ousa
definir)...Zero! Tem a ver única e exclusivamente com a incapacidade de Jorge
Jesus em lidar com alguém tão inteligente e sagaz como Francisco Geraldes.
Mas como pode
o Treinador leonino ser incapaz de trabalhar, lapidar e potenciar o talento do
ex-Moreirense? A minha resposta é simples: Jorge Jesus gosta de “produtos
criados” por si, ensinados por si, “acabados” por si. Ou seja, gosta de ser ele
o “responsável” pelo expoente máximo da carreira dos seus jogadores. Sempre
dentro das suas Ideias, dos seus Princípios e do seu Modelo de Jogo.
Porém há
jogadores que estão acima do Modelo de Jogo pela magia, criatividade,
repentismo e inteligência que “emprestam” ao jogo. Jogadores que já não podem
ser “criados” e “acabados” nas mãos do Treinador pelo simples facto de
conhecerem o jogo tão bem ou melhor do que o próprio Treinador. Eu acredito que
Francisco Geraldes é claramente um desses jogadores e que Jorge Jesus não sabe
lidar com isso. Duvidam? Olhemos então para...
“Pequeno Génio”.
“Messizinho do Seixal”. Estes foram alguns dos cognomes utilizados pelos
adeptos do SL Benfica em referência ao enorme talento de Bernardo Silva ao
longo da sua passagem pelo clube da Luz. A tal magia, a tal criatividade, a tal
inteligência que referi anteriormente estiveram sempre presentes no futebol do
actual jogador dos citizens.
Seria de
prever que Bernardo Silva teria um radioso futuro ao serviço da equipa
principal dos encarnados, não? Com o talento e a inteligência que sempre
demonstrou ter, facilmente se previa Bernardo Silva como um dos rostos do novo
SL Benfica “Made in Seixal”. Pois, mas não foi isso que aconteceu...
Depois de ter percebido
que o seu futuro na equipa sénior tinha a mesma cor de um furo em que se
descobre petróleo, o “Pequeno Génio” do Seixal decidiu-se pelo adeus ao clube
do seu coração e rumou ao Principado do Mónaco, onde, em três temporadas,
demonstrou tudo aquilo que sempre lhe viram: Inteligência Futebolística,
talento e alegria a fazer aquilo que mais sabe e mais gosta. Tudo porque
Leonardo Jardim soube entender essa mesma Inteligência Futebolística e apostou
nele como Médio Ofensivo e não como Lateral Esquerdo...
O resto é
História: transferido para o Manchester City, passando a estar ao serviço do
Treinador que mais e melhor aprecia e trabalha a Inteligência.
Ainda milhões
de portugueses se perguntavam quem era o novo “6” do FC Porto de Lopetegui e já
Rúben Neves marcava um golo na jornada inaugural da I Liga em 2014/2015.
Tacticamente irrepreensível, dono de uma visão de jogo e uma classe ímpares,
era a maturidade competitiva de Rúben Neves que mais impressionava os adeptos
do Futebol Nacional. E estas características advêm de onde? Da Inteligência
Futebolística deste jovem prodígio.
De lá para cá,
infelizmente e contra muitas previsões, Rúben Neves não conseguiu afirmar-se no
panorama futebolístico nacional, acabando por perder fulgor no último ano e
meio, a ponto de rumar ao Championship (II Liga Inglesa). O que não deixa de
ser curioso, visto que na época passada o jovem dragão quase nunca foi
opção...com o mesmo Treinador que o vai orientar agora no Wolverhampton.
Alguém
acredita mesmo que Nuno Espírito Santo vai apostar firmemente em Rúben Neves
agora, num campeonato muito mais competitivo, físico e exigente, quando não o
fez na última temporada?
De todos estes
exemplos, Bryan Ruiz é o único que já se encontra acima dos 30 anos. O que não
lhe retira talento e inteligência, antes pelo contrário, podendo ainda
acrescentar-se a experiência ao rol de qualidades do internacional
costa-riquenho. Bryan Ruiz foi uma das grandes figuras do Sporting CP de
2015/2016, naquela que foi a temporada de estreia de Jorge Jesus em Alvalade.
De peça flulcral e extensão do Treinador no relvado (foram várias as vezes que
vimos Jorge Jesus e Bryan Ruiz a trocarem impressões junto ao banco de
suplentes ou com o decorrer do jogo) a dispensável passaram-se apenas alguns
meses.
O cansaço
acumulado ao longo de inúmeros anos sem férias, aliado ao mau campeonato
realizado pelo Sporting CP na época passada, “atiraram” Ruiz para o “poço dos
culpados” de Jorge Jesus, ao ponto do ex-nº 10 ter cedido o “seu” número a
outro colega e de ter agora “guia de marcha” para fora de Alvalade.
A pergunta que
me apraz fazer é: num plantel com Bruno César, Doumbia e Matheus Oliveira, por
exemplo, querem que acredite que Bryan Ruiz não tem lugar nem pode disputar um
lugar nos 18 ou nos 11 eleitos?
Penso que
cabe-nos a nós, Treinadores, saber aproveitar a Inteligência Futebolística dos
nossos jogadores. Acredito plenamente que as melhores equipas são aquelas que
se constituem pelas “sociedades de inteligências”, como costumo dizer. E o Barcelona
de Guardiola, o Bayer Munique de Jupp Heynchess e o actual Real Madrid de
Zidane demonstram-no isso mesmo.
Laurindo Filho
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