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O Raio de Acção do Treinador de Formação


Antes de mais, ocorre-me a importância de apontar o facto de algumas coisas que abordarei neste artigo não me serem familiares. Nunca fui sujeito a elas, não sabendo se beneficiei disso ou não. Porque não sou só um Treinador de Formação, sou também um Treinador em Formação. E a Formação que se compra e se estuda é a menos importante no meu entender. Falemos da experienciação.
O Treinador de Formação tem um raio de acção limitado em todas as acções extra Futebol. Primeiro que tudo, é importante reter e respeitar uma premissa inerente ao Futebol de Formação: o Treinador depende dos Pais dos seus atletas. Este facto não é difícil de compreender, já que,  se os Pais dos atletas não mostrarem disponibilidade para acompanhar o projecto desportivo, o Treinador terá sempre as suas opções limitadas. O tal raio de acção.
Com efeito, reafirmo que o raio de acção do Treinador de Formação é bastante reduzido, senão vejamos: para mim, treinar um jovem atleta vai muito para lá dos 2/3 treinos semanais e do jogo ao fim-de-semana. Compreendamos que, para surtir efeito na cabeça de um jovem e para que esse jovem procure realmente aplicar os conhecimentos ensinados pelo Treinador, este tem obrigatoriamente que impressionar o seu atleta. Aliás, catuvar é o melhor termo. E cativá-lo não só ao nível do conhecimento que lhe transmite como até da relação de companheirismo que deverá criar com o seu atleta, com as devidas restrições construídas pelo estatuto de cada um (Treinador e Atleta).
Ora este raio de acção, sendo curto, pode alargar-se. E deve. Ainda assim, atentemos a outra realidade referente ao Futebol de Formação, o espaço competitivo (jogo). Há duas semanas tive a oportunidade de acompanhar dois jogos de equipas sub-9 que nada tinham a ver com a minha. Por uma questão de curiosidade, não mais do que isso. Analisando esses jogos, relembrei a triste realidade de que um atleta jovem tem 20 Treinadores por jogo. Estranho, e estando numa bancada, por vezes há uma certa vontade de soltar uma gargalhada, mas quando o caso reporta ao próprio Treinador o sentimento não será certamente de alegria. Consideremos o Treinador Principal e a possibilidade, que deveria ser sempre realidade, de existir um Treinador Adjunto como os principais rostos da autoridade num jogo de jovens atletas, mas depois teremos os pais também a dar os seus palpites, a apontar, a aconselhar, etc.
Ponto um: não considero que o façam por mal, muito menos para prejudicar a equipa. Fazem-no pela força do impulso que é ver o seu filho e os seus colegas em situações de dificuldade. Uma tentativa de quem procura ajudar, ainda assim, olharei sempre para o overflood de informação como algo prejudicial.
Ponto dois: considero o incentivo algo precioso e vindo da bancada é sempre bem-vindo.


Ora, apontadas algumas circunstâncias praticamente inerentes ao Futebol de Formação, respeitantes aos pais, é tempo de abordar outras circunstâncias, desta vez logísticas inerentes ao Futebol de Formação, e aqui sim começam as minhas dúvidas.
Durante os treinos e os jogos a preocupação do Treinador deverá ser a boa condução da actividade. O principal objectivo será sempre o progresso individual inserido num progresso colectivo, nunca descurando o aspecto lúdico do treino, com o objectivo de cultivar o “bichinho” do Futebol no atleta. Pois como dizia Johan Cruyff: “ Tudo para mim se iniciou na rua”. Para que o atleta leve o Futebol até à rua, esse gosto pela bola terá de ser cultivado, sendo o treino uma ferramenta para esse fim. Então, se o treino está focado para o Futebol, como tem o Treinador possibilidade de interagir com o seu atleta de forma a conhecê-lo suficientemente para preparar estratégias para o cativar numa nota mais pessoal?
Nunca tive problemas sérios com Pais de atletas. Não sei se isso é bom ou é mau, na verdade. Com efeito, procurei sempre manter boas relações com os Pais dos atletas que fui treinando, escolhendo manter sempre uma relação próxima com dois ou três daqueles mais presentes. Pode parecer estranho, mas passo a explicar: tenho conhecimento de clubes (de maior dimensão) em que os Pais não estão autorizados a presenciar os treinos. Tenho conhecimento de clubes que recusam um relacionamento entre Treinadores e Pais, argumentando que o Treinador está para treinar e se alguma conversa terá de ocorrer, ocorrerá entre Pais e Direcção/Coordenação.
Ora, admitamos que os Pais falam entre si e têm uma boa relação de camaradagem. Tendo uma relação próxima com dois ou três deles, é possível ter uma noção geral do estado do escalão, do comportamento dos jovens fora do Futebol, das brincadeiras que têm, do estado em que estão os seus estudos, entre outras curiosidades. Este know-how é muito importante para o Treinador ajustar a forma como aborda individualmente cada atleta. Quanto mais conhecimento acerca das características psicológicas do jovem o Treinador tiver, melhor será a sua abordagem.
Uma relação próxima com os Pais dos atletas permitirá ter este conhecimento e muitos outros, nunca rompendo com a clara hierarquia que terá de existir nas opções a tomar. Esta relação mais próxima, permitirá ao Treinador alargar o seu raio de acção, como referi anteriormente. E aumentar o raio de acção não é mais do que conhecer verdadeiramente o seu jovem atleta. Nunca fui sujeito a um projeto desportivo em que não existisse qualquer tipo de contacto com os pais dos meus atletas. Esse conhecimento, que considero crucial na abordagem do trabalho, teria de ser adquirido através de muitas conversas individuais com os atletas no pós-treino.
Aumentar o raio de acção, ou dir-me-ão mais plausível a expressão “ aumentar o conhecimento em relação ao plantel para se aplicar o raio de acção “, é um trabalho crucial do Treinador. Sem ele o seu trabalho nunca atingirá a plenitude qualitativa.

                                                                         Pedro Cardoso


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