O Futebol está
cada vez mais rápido. Podemos ver isso na maneira como as equipas procuram
reagir rapidamente à perda de bola. Podemos ver isso na forma como cada vez
mais equipas optam por abdicar da Posse de Bola para apostar única e
exclusivamente no Contra-Ataque. Podemos constatar a maior rapidez presente no
Futebol sob as mais distintas perspectivas, mas há uma perspectiva em que noto
que a rapidez é cada vez maior. Falo da rapidez com que alguns Treinadores
deixam de pensar com a sua própria cabeça, passando a pensar pela cabeça de
terceiros…
Não sendo, de
todo, um tema agradável, penso que este é um tema essencial. Creio que grande
parte da evolução do Futebol Amador (e até mesmo Profissional) passa pela
afirmação do Treinador através da afirmação das suas ideias. Acredito que os
demais agentes desportivos ligados ao Futebol (Amador e Profissional, de
Formação e Sénior) só irão evoluir quando o Treinador conseguir atingir a sua
independência intelectual, a sua total afirmação intelectual.
Quantos de
nós, Treinadores, não conhecemos um ou mais colegas que já foram condicionados
naquelas que são as suas funções enquanto Treinador?
Quantos de
nós, Treinadores, não conhecemos um ou mais colegas cujo trabalho foi alvo de
interferência (directa ou indirecta) por parte de um Presidente, de um
Empresário, de um Director Desportivo ou até mesmo de um Pai?
Quantos de
nós, Treinadores, não fomos já alvo (pelo menos uma vez) dessas tentativas de
influência, dessas tentativas de condicionamento?
Eu já! Muitas
vezes! Mais do que aquelas que alguma vez imaginei vir a ser possível em seis
anos como Treinador Principal. Já tive quem me quisesse impor um 11 inicial. Já
tive quem me quisesse impor qualquer sistema táctico, menos aquele que eu
queria trabalhar com a minha equipa. Já tive quem me quisesse impor uma convocatória.
Já tive quem mandasse o filho ouvir as palestras para poder saber o que eu
havia dito. Já tive quem mandasse o filho questionar-me acerca do meu microciclo
semanal. Já tive quem me quisesse impor as suas “ideias de treino” sem nunca
ter visto um microciclo semanal meu. E podia continuar aqui até ao final do mês
a dar exemplos de tentativa de condicionamento do meu trabalho.
Sabem o que
fiz? Em todas as situações aqui relatadas? Recusei-as liminarmente. Ouvi sempre
tudo, umas vezes de forma mais calma, outras vezes com menos paciência, mas
ouvi sempre tudo. Contudo, nunca cedi a pressões, a chantagens, a intromissões
naquilo que era (e é) o meu trabalho. Pensei sempre pela minha cabeça…
Obviamente que
há consequências para este género de postura. Não fazer o que um Presidente te
impõe é dar início a uma “guerra” que, mais cedo ou mais tarde, vai ditar a tua
saída. Não dar a titularidade ao jogador X (que não tem qualidade, que treina
mal e que não se se enquadra no teu Modelo de Jogo), cujo Pai é o principal
patrocinador do clube, é assegurar que ou o clube irá perder um patrocinador ou
o clube vai arranjar um Treinador que garanta a permanência desse mesmo
patrocinador. Não dar minutos ao jogador Y (a anos-luz daquilo que os restantes
colegas conseguem fazer), cujo empresário ajuda financeiramente o clube, é
criar uma possível situação de instabilidade dentro do balneário ou até mesmo
dentro do próprio clube. E nem sequer me vou pronunciar acerca dos graus de
parentesco que continuam a influenciar tomadas de decisão no Futebol Amador,
Semi-Profissional e Profissional.
Podem dizer
agora: “Ok, isso é tudo muito bonito, mas e se não cedermos e formos
despedidos?”, “E se nós ajustarmos um pouco dali e um pouco daqui, mas mantendo
sempre alguma independência?”
Há coisas que
não me passam ao lado. Eu sei que há quem tenha medo de “sair do circuito”. Eu
sei que há quem tenha medo de nunca mais voltar a treinar. Eu sei que há quem
pense que pode ceder apenas um pouquinho ali e um pouquinho aqui, naquela
convocatória, naquele 11 inicial, naquele sistema táctico…
Eu não estou
no “circuito”. Nunca estive. Nem sequer sei se alguma vez estarei. Com a minha personalidade…Mas
sei que não existem pequenas cedências. Quem começa por ceder pouco, acaba
sempre por ceder muito. Sei que não existem pequenas influências. Quem começa
por se deixar influenciar de forma pequena nas suas decisões, acaba sempre por
ser grandemente influenciado nas suas decisões. Sei que não existem pequenas
interferências. Quem começa por permitir pequenas interferências, acaba sempre
por perder o “sinal” do seu próprio trabalho. Sei que um Treinador nunca poderá
dormir de consciência tranquila e satisfeito com uma ligeira independência
porque isso não existe. Ou se é totalmente independente ou se é autónomo.
E também sei
que não é fácil. Querer ser intelectualmente independente e querer mostrar
competências através da afirmação das suas próprias ideias é desgastante. Querer
afirmar-se como alguém válido porque se pensa por si mesmo é complicado. Cada
vez mais complicado. Principalmente num mundo em que todos parecem querer ser
aquilo não são.
Mas é o único
caminho possível. Pelo menos para mim. Porque à velocidade com que se despedem
Treinadores ao fim de 4/5 jogos sem vencer, à velocidade com que os interesses
mudam consoante a cor do dinheiro, à velocidade com que novos “amigos” surgem
no mundo do Futebol, sejamos sinceros…
Vale mais
pensarmos pelos nossa própria cabeça!
Laurindo Filho
2 Comentários
Parabéns, um texto reflexivo para ler e reler diversas vezes.
ResponderEliminarUm dos nossos propósitos enquanto blog é levar as pessoas a pensar e a debater questões que julgamos serem pertinentes. Como esta que abordámos neste artigo.
EliminarObrigado pelo seu comentário.
Continue a acompanhar-nos.
Cumprimentos