Uma das coisas
que tenho ouvido no mundo do Futebol é que a gestão de um grupo é sempre mais
fácil quando se ganha. Porque as vitórias são um excelente tónico anímico. Porque
as vitórias ajudam a disfarçar quaisquer debilidades/imperfeições existentes no
Modelo de Jogo idealizado pelo Treinador e levado a cabo pela equipa. Porque as
vitórias são a validação das Ideias do Treinador. Porque ganhar um jogo
significa ter cerca de 30% do próximo jogo ganho, como diria Jorge Valdano.
Daqui se
depreende então que, quando há vitórias, o cenário é perfeito, certo? Mesmo que
a qualidade de jogo apresentada não seja aprazível. Daqui se entende que,
quando há vitórias, tudo parece idílico, será? Mesmo que se perceba que o
individual está a resolver os problemas que competem ser resolvidos pelo
colectivo. E daqui se assimila que, quando há vitórias, tudo parece estar bem,
mesmo que pouco ou nada esteja bem…certo?
Então e como
será a gestão de um grupo quando não se ganha? Como será a gestão de um
balneário que lida mais vezes com a derrota do que o expectável? Como será a
gestão emocional dos jogadores que, ao fim-de-semana, não vêem recompensado o
seu esforço semanal?
Nada melhor do
que a minha experiência pessoal para me ajudar neste artigo. Mais precisamente
a experiência que vivi ao longo desta época 2016/2017. Uma época que me deu a
conhecer de forma mais íntima o lado amargo da derrota. Uma época que me levou
a descobrir os caminhos percorridos por quem perde mais vezes do que aquelas
que esperava. Uma época que me ajudou a perceber o quão gratificante pode ser a
gestão emocional de um grupo que trabalha de modo a vencer, mas que, por uma
razão ou por outra, nem sempre vence.
Começo por
dizer o óbvio: não há uma receita nem sequer um livro de receitas mágicas que
nos ajude a lidar com um cenário de derrotas. Não há! O que há, ou pode haver
se nos predispusermos a isso, é a sensibilidade para um conjunto de situações
que podemos procurar antever sem nunca podermos ter a certeza das nossas “previsões”,
pois é impossível prevermos tudo e controlarmos tudo, seja a nível do trabalho
de campo técnico-táctico, seja a nível das relações e reacções que têm lugar
dentro do grupo com o qual trabalhamos…e do qual fazemos parte.
E este parece-me ser um ponto fulcral. O
Treinador nunca se pode esquecer de que faz parte do grupo que orienta. O
Treinador nunca se pode colocar à margem do grupo de trabalho quando os
resultados menos positivos começam a surgir (seja por sua iniciativa, seja por
iniciativa de terceiros). O Treinador nunca se pode esquecer que treina porque
existe um grupo de trabalho e que ele é o principal responsável por esse mesmo
grupo de trabalho.
Como tal, o
Treinador deve medir muito bem as suas acções e as suas palavras. A forma como
comunica, externa ou internamente, pode influenciar o seu rendimento junto do
grupo de trabalho e, consequentemente, o rendimento do próprio grupo de
trabalho. Dizer o que um determinado Treinador disse recentemente, poucos dias
após a sua apresentação (“o buraco já está cavado, ou eles se metem ainda mais
no buraco ou saímos dele”), não só é de um uma extrema deselegância como pode
vir a ser contraproducente. E o referido Treinador em dois jogos já efectuados
somou…duas derrotas…
Para além da
percepção do seu papel como membro integrante do grupo de jogadores que orienta,
o Treinador não pode nunca esquecer-se da componente humana dos seus jogadores.
Bem sei que muitos irão pensar (e dizer) que isto é óbvio, mas lembrem-se de um
pormenor: não estamos a falar de grupos que vencem sempre ou 75% dos seus
jogos. Estamos a falar de grupos e balneários que vencem menos do que os outros…sem
que isso signifique propriamente menor qualidade no trabalho desenvolvido em conjunto
por todos. Mas isso já daria tema para um outro artigo…
Assim sendo, é
imperial que o Treinador não se esqueça que está a lidar com seres humanos. Os
quais, tal como o próprio Treinador, detestam perder, ficam frustrados,
sentem-se impotentes e caem facilmente naquilo a que eu chamo o “poço da
desmotivação”. Sejamos sinceros: treinar à chuva, ao frio, por vezes com neve,
perder horas de convívio familiar, perder fins-de-semana, não beber uns copos
com os amigos…para depois chegar ao domingo e não ganhar…é duro! Muito duro! E o Treinador tem de perceber isso. Não pode
negligenciar estes factores. Se o fizer…vida difícil para si, para a sua
gestão, para a sua liderança…
O Treinador
deve ainda orientar o seu foco, mesmo que este não possa ser traduzido na
obtenção de pontos e no alcançar da melhor classificação possível. O Treinador
deve perceber que, se as condições não lhe permitem disputar os 3 pontos a cada
jogo de igual para igual com os seus adversários (mesmo que ele tente e seja
audacioso ao ponto de nunca jogar com o bloco baixo, ao ponto de nunca apostar
no anti-jogo, etc), então o foco tem de ser outro. Quiçá mais nobre do que a
vitória, diria eu: o desenvolvimento pessoal/individual dos seus atletas.
Não será nunca
uma tarefa fácil. Principalmente se não tiverem um staff técnico que vos ajude
a desenvolver um trabalho que vos permita potenciar individualmente cada um dos
vossos atletas, quer do ponto de vista técnico-táctico, quer do ponto de vista
humano (este sim, o mais importante neste cenário). Mas eu acredito que é por
aqui que devemos ir. Principalmente depois de ter recebido esta mensagem de um
jogador na última semana de treinos desta época:
“Obrigado!
Agradecer é a única coisa que eu posso fazer este momento porque a alegria com
que cheguei ontem a casa pensei que nunca mais iria encontrar. Obrigado! Não só
por acreditar que eu poderia fazer alguma coisa, mas por confiar e me meter lá
dentro. Acreditar quando já nem eu acreditava. Ainda falta um jogo e mais uma
semana de trabalho, mas não posso deixar de agradecer o que fez por mim este
ano. Não só como treinador, mas como amigo e conselheiro. Obrigado do fundo do
coração. ”
Treinador…Lado
Humano dos Jogadores…Reorientação do Foco…Será que depois disto, e perante uma
época em que as vitórias não surgem com a naturalidade desejada, ainda resta
alguma coisa ao Treinador? Eu diria que sim…
Resta ao Treinador
colocar-se no lugar dos seus jogadores. Resta ao Treinador ser sincero,
frontal, honesto e verdadeiro para com os seus jogadores. Em relação a tudo e a
todos. Sem tabus, sem dogmas, sem receios. Porque a verdade liberta, aproxima e
aglutina as pessoas. Resta ao Treinador mostrar que nem mesmo um conjunto de
resultados menos positivos o impedirá de criar as condições necessárias para
que o grupo permaneça junto, unido e saudável. Resta ao Treinador mostrar que a
gestão de um balneário vencedor está ao alcance de quase todos, mas a gestão de
um balneário menos vitorioso está ao alcance de muito poucos.
Laurindo Filho
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