De Bruno Fernandes a João Moutinho, com uma breve menção a Cristiano
Ronaldo. O que têm todos estes jogadores em comum? São portugueses, têm muita
qualidade e todos eles são melhores/especialistas em algo e não tão bons noutro
tipo de tarefas, algo que acontece com todo e qualquer indivíduo.
O Sporting Clube de Portugal deu início ao campeonato 2017/2018 com uma
vitória por 2-0 na Vila das Aves frente a um Desportivo de Aves à procura de se
conhecer e de se entrosar, por ser um elenco repleto de reforços, aos quais brevemente
todos poderão reconhecer qualidade. É ponto assente que o Sporting não realizou
uma grande partida, em termos de qualidade exibicional. E não o fez muito por
culpa de Bruno Fernandes ou da posição em que este se encontrava no campo.
Jorge Jesus optou por prescindir de Daniel Podence para introduzir Adrien
Silva no onze, subindo Bruno Fernandes para fazer dupla com Bas Dost. Adaptar
as qualidades do jogador à equipa ou montar a equipa de maneira a favorecer as
qualidades do jogador? Falei eu, anteriormente, que há jogadores que têm valias
que não podem ser ignoradas. Através da vontade de Jorge Jesus, Bruno Fernandes
deixou, na Vila das Aves, de ser decisivo no passe e na construção do jogo
ofensivo da sua equipa. Valias essas, em que ele se transcende. Ao lado de Bas
Dost deixa de ter a visão do campo e das peças que tinha como “8”, sendo que
tão adiantado no campo a capacidade de “colocar a bola onde quer” deixa de ser
requisitada.
As mais-valias de Bruno Fernandes
são o passe e a visão de jogo. E Jesus está a pedir-lhes outras coisas, outras
coisas em que não é tão bom. Não querendo comparar Bruno Fernandes a Xavi, Xabi
Alonso ou Andrea Pirlo, imagina o leitor do Futebol Apoiado a ver estes
jogadores tão avançados no terreno? Jamais em tempo algum. Tão à frente, não
usariam as capacidades em que melhor podiam confiar, transportando o seu
Futebol para patamares de qualidade inferiores. Um caso para seguir nos
próximos tempos.
Viajando até ao Principado, o desfalcadíssimo Mónaco de Leonardo Jardim
iniciou a defesa do título da Ligue 1 com uma vitória difícil frente ao Toulouse,
depois de estar a perder por duas vezes. João Moutinho foi titular, remetendo o
jovem talento Tielemans para o banco de suplentes, sendo que Jorge suplantou
Kongolo. Foram as surpresas num onze inicial onde Rony Lopes tentou “fazer” de Bernardo Silva, uma missão com o
seu grau de dificuldade. E Moutinho?
Perante o término das carreiras de Rui Costa e Deco, do encaminhar para
as reformas de Maniche e Raul Meireles, João Moutinho tornou-se o médio
português de maior gabarito. Formado no Sporting Clube de Portugal, foi após
protagonizar aquela transferência polémica para o Futebol Clube do Porto (e de
ser apelidado de “maçã podre”) que cimentou o seu jogo e progrediu merecendo os
elogios que um pouco por todo o Portugal se lhe atribuíram. Como todo o indivíduo João Moutinho tinha valias
que não podiam ser ignoradas. A alta rotação com que jogava, a raça com que se
dedicava a cada lance e a velocidade que tinha foram as armas que o levaram a
merecer a confiança do Mónaco e viajar até França. Foi perdendo fulgor tanto no
seu clube, como na sua Selecção perante uma mão cheia de jovens médios que foi
surgindo e ganhando estatuto.
Olhando para o jogo de João Moutinho, responsável por duas assistências
para golo, fruto de um livre e um canto, o passar do tempo obrigou a João
Moutinho à procura de atributos que não potenciam tanto o seu jogo. Refiro-me a
alguns lances que vi no jogo Mónaco vs Toulouse, em que os adversários
enfrentavam Moutinho na velocidade, ultrapassando-o e causando depois problemas
à defesa monegasca. Não era uma imagem que há cinco/seis anos atrás veríamos
correntemente. A raça e a alta rotação mantêm-se, mas Moutinho é agora
requisitado noutras competências, as quais não o põem tão à-vontade. Agora Moutinho
já não é o jogador mais rápido em campo. O “envelhecimento” levou-o a outros
caminhos.
Dois casos diferentes, um por opção do Treinador, outro pelo passar do
tempo. E Cristiano Ronaldo? Aquando da sua passagem pelo Manchester United, as
suas principais qualidades residiam no virtuosismo e na capacidade de
desequilíbrio, sendo que foi capaz de juntar a estas duas uma capacidade de
marcar golos fora do normal. Viajou até Madrid para nunca mais sair (até ao
hoje). Aprimorou esta última capacidade para deixar as restantes um pouco de
parte. Opção do Treinador? Consequências do passar do tempo? Opção própria,
parece-me. A capacidade do jogador alterar o seu estilo baseado no campeonato
em que se encontra, sendo que campeonatos diferentes pedem um Futebol distinto,
muito ou pouco, mas sempre distinto.
O foco de CR7 passou a ser o golo. Podemos condená-lo? Afinal de contas o campeonato é atribuído à
equipa com mais pontos e para se amealharem pontos são necessários golos. O
golo é o objetivo do jogo. Os dribblings frenéticos contribuem para o espectáculo,
mas não se festeja um dribbling, festeja-se um golo. Surgiu aqui uma mudança
drástica no estilo de jogo de um jogador que por muitos é considerado o melhor
do mundo. Porque só os melhores têm esta capacidade. A de serem genais em
várias capacidades requisitadas pelo jogo e não terem uma ou duas
especialidades...
Assim sendo, até para fechar a tal questão que visava dar sentido ao
texto, parece-me que há valias que os jogadores possuem que não podem ser
ignoradas. Se os casos de Cristiano e Moutinho são diferentes, Bruno Fernandes
parece ser um “8” puro. Mesmo que para isso tenha de partilhar minutos com
Adrien Silva. Caso continue ao lado de Bas Dost, será a tentativa clara de
Jesus em adaptar algumas qualidades do jogador à equipa, tal como o próprio
referiu (posse de bola, golo, tomada de decisão no ultimo terço), e não
enaltecer aquelas em que Bruno Fernandes é precisamente craque. Até porque segundo
o mesmo Daniel Podence não produz ainda o suficiente… Será este o caminho?
Pedro Cardoso
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