Tenho por hábito dizer que o Desporto em Portugal tem um grande problema.
Tenho igualmente por hábito dizer que o Futebol Português tem um grande
problema. Aprofundando, o Desporto em Portugal vive à volta do Futebol,
considerado como o Desporto-Rei.
Qualquer outro desporto, e qualquer outro desportista praticante de
desportos que não o Futebol, tem razões para se sentir injustiçado em relação
ao praticante de Futebol. Já o ouvimos da boca de tantos e tão bons atletas que
levaram as cores do nosso país ao auge em várias competições e que certamente
mereciam bem mais…reconhecimento.
Tratando-se o blog Futebol Apoiado um espaço de discussão e partilha de
ideias sobre temáticas referentes ao Futebol, por ser o desporto que nos ocupa
horas e horas de reflexão, considero que em Portugal vive-se num exagero
descabido na atenção que se dá aos três “grandes”. Tudo o que mexe é Sporting,
Benfica e Porto. Este facto faz com que as convocatórias de Fernando Santos,
por vezes, tenham alguns casos difíceis de explicar. Casos que acontecem muito
raramente, mas que merecem reflexão.
Bruno Varela assumiu em 2017/2018 a titularidade na baliza do Benfica,
contra todas as expectativas que apontavam um regresso de Júlio César, outrora
considerado o melhor Guarda-Redes do mundo, ou uma solução encontrada no
mercado para preencher a baliza da equipa de Rui Vitória. Varela tem ganho a
admiração dos adeptos, demonstrando cada vez mais confiança à medida que os
jogos passam. As boas exibições e a segurança apresentada neste início de
temporada resultaram numa chamada à Selecção Portuguesa para os jogos com as
Ilhas Faroé e Hungria.
O objectivo deste exercício de opinião não se prende com a necessidade de
avaliar esta chamada. Se é merecida, se não é. O que está aqui em questão é a
constante inércia existente nos seleccionadores nacionais em não convocar
jogadores a actuar em Portugal que não actuem num dos três “grandes”.
Com efeito, Bruno Varela esteve uma época em Setúbal aprimorando o seu
jogo, com o objectivo de representar o clube onde se formou, o Benfica. Nunca
mereceu a convocatória, mesmo estando em ótimo plano durante toda a época.
Então o que mudou desde o último jogo com a camisola do Vitória de Setúbal para
a presente data? O período de férias e cinco titularidades de águia ao peito.
Cinco jogos pelo Benfica e está na Selecção. Durante toda uma época de sucesso,
onde somou trinta jogos como titular do Vitória de Setúbal, não mereceu a
chamada, não mereceu a confiança de Fernando Santos.
Outro caso peculiar é o de Ricardo Pereira. Não querendo discutir se a
sua recente chamada a equipa das quinas é merecida ou não, o lateral direito do
Futebol Clube do Porto, que soma já três jogos como titular, mereceu a chamada
de Fernando Santos. É certo que esta chamada se trata de uma terceira opção
para a lateral direita, isto porque João Cancelo apresentou problemas físicos e
a convocatória teve de ser mudada. Mas para os mais desatentos, Ricardo Pereira
fez um total de 57 jogos, apresentando um nível que lhe permitiu ser associado
ao Tottenham durante o último. E foram 57 jogos de alto nível, realizados ao
longo de duas temporadas, sendo que numa delas foi considerado o melhor lateral
direito da Ligue 1. Mas três jogos pelo Futebol Clube do Porto resultaram numa
chamada à Selecção. O mesmo raciocínio pode acontecer com Bruno Fernandes, actual
jogador do Sporting Clube de Portugal.
O último caso parecido com o de Bruno Varela prende-se com André André e
o raciocínio é precisamente o mesmo. Três temporadas de grande nível em
Guimarães levaram o Futebol Clube do Porto a adquirir o seu passe. Escassos
meses de boas prestações no Dragão e tinha a porta da Selecção aberta para se
estrear com a camisola das quinas. É, sem dúvida, um fenómeno. Nem vale a pena
caminharmos aos tempos do goleador João Tomás, que por mais golos que marcasse
e por menos soluções que houvesse para a posição de ponta de lança, o atleta
nascido em Oliveira do Bairro nunca merecia a confiança dos selecionadores.
Então, e relembrando que Rafa foi ao Europeu de França somar os minutos
que todos sabemos que somou, como se explica este fenómeno? Será que por muito
que atletas trabalhem em clubes portugueses, mas fora dos três grandes, têm
automaticamente uma chance muito reduzida de fazerem parte da Selecção do seu
país? Como se explica este fenómeno? Será plausível pensar-se que meia dúzia de
jogos pelos três grandes são um factor de confiança mais preponderante do que
épocas de sucesso noutros clubes?
A verdade é que a nossa Selecção tem cada vez mais
soluções de grande qualidade. Temos jogadores a jogar em quase todas as
melhores equipas do mundo, o que engrandece o Futebol Português. Mas nas
restantes equipas portuguesas há muito talento, o qual, com um voto de
confiança poderia revelar-se. Até porque a dada altura a nossa equipa terá de
se renovar, porque os trintões não duram para sempre.
Pedro Cardoso
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